sexta-feira, 23 de maio de 2008

Ah...você não sabe o meu passar...


Quando eu era pequena, sempre ouvia minha avó reclamar de uma agonia, uma tal de " farnizia" que a deixava meio cansada. Lembro bem, ela sentava na cadeira na porta e suspirava alto, reclamava do calor. De vez em quando, achava minha avó muito exagerada, mas hoje percebo que o ela sentia era falta de ar, um sintoma da doença, uma insufiência pulmonar que, aos poucos, foi a tirando do nosso convívio.
Em fevereiro de 93, ela sentiu uma dor forte no abdomen. Problemas no fígado? Talvez algo que ela tenha comido...vamos fazer um chá. Eu no papel de criança, não fazia nada. Ficava rodeando minha Braunizia, arrumando o pente em seus cabelos grisalhos, as vezes pegava nas mãos e via as duas alianças na mão esquerda. A dela e a do marido que morreu quando ela ainda era uma jovem. Não teve chá, não teve remédio. Ela foi ao hospital e, dias depois, foi internada. Era difícil ver a cadeira vazia, era díficil não ter com quem cortar rapaduras e misturar na farinha ( um costume do interior, eu gostava). Quando veio a notícia de que ela receberia alta, fiquei cheia de expectativas, fiz todas as festas dentro de mim. Afinal, tudo ia voltar ao normal, mas não foi assim. Braunizia voltou diferente, mal levantava os olhos, parecia não reconhecer os netos e não queria mais cantar comigo, todas as músicas que eram nossas. Foi uma terça-feira que ela nos deixou, um suspiro último. A agonia derradeira. Eu tinha dez anos, toda a cena ficou na minha cabeça. Era a primeira vez que a morte levava de mim, uma pessoa amada. Talvez foi nessa época, fiquei desiludida com a Igreja, tentei o espiritismo, mas depois me guardei na saudade.

O que aquela pequena mulher deixou para mim, nada vai mudar. Lembro do sorriso, das histórias engraçadas, da minha vontade de ter seios fartos e cabelos com cachos tão bonitos. Dela veio o meu gosto pelo roxo e o conhecimento de canções que talvez eu nunca descubra o nome dos verdadeiros autores.
Vai ser sempre a nossa canção. A canção dos fins da tarde, com o céu ficando rosado...
" Aquelas cartas que eu te dei tremendo.
Aquelas cartas que eu te dei enfim...
despedaçadas quero elas todas.
Por Deus te peço, esqueças de mim.
Oh anjo ingrato, vivo iludida
Por outra amante queres me deixar
Ainda espero ver-te arrependido
Chorando, em prantos, sem poder me amar..."
FOTO: Encontrada qse perdida na ação do tempo. Eu sou o bebê, nos braços da avó, as meninas são minhas irmãs

2 sobrou pra você!:

Anônimo disse...

:) beijos meu bem, sempre é bom ter lembranças.

Kelly Campos disse...

Que nenem mais fofa!!